Dos sete pecados capitais, é difícil apontar um que não nos tente diariamente. Se domingo rotineiramente é o dia da preguiça, pode-se dizer que esta segunda-feira também amanheceu bastante preguiçosa. A diferença é que domingo é domingo e segunda é segunda. Ou seja, dia de mandar a preguiça caçar outro lugar pra se instalar. Reunindo todas as minhas forças, dei início hoje a parte do cansativo processo de mudança. Acho que essa é a pior parte. Caixas de papelão reunidas, jornais espalhados para embrulhar copos e vidros, panos para limpar a poeira, dor na alma e nas costas de tanto ir e vir.
Malões emprestados, comecei a separar o que vai e o que fica, o que vai agora e o que vai depois, o que pode sumir do meu guarda-roupa e o que não pode faltar. Não é fácil. É um processo meticuloso e delicado, que consome boa parte dos meus neurônios - não riam. A vontade realmente é de fechar os olhos, dormir e acordar com tudo arrumado no novo apartamento alugado. Armários por todos os lados e cômodos, roupas já organizadas, eletrodomésticos e portáteis, livros, cds e dvds em suas respectivas prateleiras. O chão encerado escondendo os anos de desgaste e exposição. As paredes peladas e limpinhas acolhendo seus novos inquilinos pelo menos no decorrer do próximo ano.
Entre uma arrumação e outra, um pouco de água para limpar a garganta. E de internet para renovar a alma. Aliás, mudança de assunto: o que seria de nós se por algum motivo absurdo ela parasse de funcionar??? Engraçado como rapidamente nos adaptamos às novas tecnologias e não mais conseguimos nos imaginar sem elas. Mas são tão recentes!!! Já estava na faculdade quando conheci IRC, ICQ e, mais tarde, MSN. Computador em casa e internet, então, antes disso eram luxo. Na escola os trabalhos eram feitos com base em pesquisa em revistas, nas bibliotecas e nas enciclopédias (aquelas mesmas que hoje em dia ficam empoeiradas na estante ou esquecidas em algum lugar no fundo do baú). Depois de rascunhados à mão, eram datilografados letra por letra - e a máquina de escrever lá de casa não era elétrica. Esses eram os bons tempos do ERROR-EX.
Mamãe certamente vai se lembrar muito bem. Até sobre futebol e copa do mundo ela escreveu! Ficou doutora em Feudalismo, Marxismo e outros ismos. Era ela que ficava horas a fio na frente da máquina de escrever. Ao lado, eu ia ditando as frases rascunhadas e rabiscadas. Parágrafo, texto, texto, texto, ponto. Parágrafo, texto, texto, texto, ponto. Espaço para recorte de figura ou nota de jornal. Parágrafo, texto, texto, ponto. E enquanto mamãe treinava seus dedos frenéticos com os inúmeros trabalhos de História da professora Ana Maria, vira e mexe eu ia pedir a papai pra me explicar a matéria de geografia. Os tais dos paralelos e meridianos não entravam na minha cabeça! Era tão difícil, meu Deus!
Alguns anos depois, as aulas caseiras de geografia cederam lugar às de física, química e matemática. Sempre gostei de exatas (de humanas e biológicas também!), mas às vezes o raciocínio humano sobressaía-se ao lógico e minha cabeça simplesmente começava a armazenar um nó de informações. Papel, lápis e caneta a postos, lá ia eu estudar. Sempre gostei disso.
Hoje tudo isso ficou pra trás, mas vez em quando deixa esse gostinho saudoso durante meu dia. Hoje não tenho diário nem agenda. Tenho um blog. Não tenho um caderninho de telefones. Tenho celular. Não tenho endereço de correspondência. Tenho e-mail. E às vezes nem voz eu uso. "Mamãe, oiê!", digito no msn. Ela, no quarto ao lado, corresponde: "oiiiiiiiiiiiiii". Mundo estranho este, né?
Ilustração vetorial de Pinups
Há um mês